sábado, 30 de junho de 2012

Currículo dos Urubus

O CURRÍCULO DOS URUBUS
Rubem Alves

“O Rei Leão, nobre cavalheiro, resolveu certa vez que nenhum dos seus súbditos haveria de morrer na ignorância. Que bem maior que a educação poderia existir? Convocou o urubu, impecavelmente trajado em sua beca doutoral, companheiro de preferências e de churrascos, para assumir a responsabilidade de organizar e redigir a cruzada do saber. Que os bichos precisavam de educação, não havia dúvidas. O problema primeiro era o que ensinar.
Questão de currículos: estabelecer as coisas sobre as quais os mestres iriam falar e os discípulos iriam aprender. Parece que havia acordo entre os participantes do grupo de trabalho, todos urubus, é claro: os pensamentos dos urubus eram os mais verdadeiros; o andar dos urubus era o mais elegante; as preferências de nariz e de língua dos urubus eram as mais adequadas para uma saúde perfeita; a cor dos urubus era a mais tranquilizante; o canto dos urubus era o mais bonito. Em suma: o que é bom para os urubus é bom para o resto dos bichos.
E assim se organizaram os currículos, com todo o rigor e precisão que as ultimas conquistas da didáctica e da psicologia da aprendizagem podiam merecer. Elaboraram-se sistemas sofisticados de avaliação para teste de aprendizagem. Os futuros mestres foram informados da importância do diálogo para que o ensino fosse mais eficaz e chegavam mesmo, uma vez por outra, a citar Martin Buber. Isto tudo sem falar na parafernália tecnológica que se importou do exterior: máquinas sofisticadas, que podiam repetir as aulas à vontade para os mais burrinhos, e fascinantes circuitos de televisão.
Ah! Que beleza! Tudo aquilo dava uma deliciosa impressão de progresso e eficiência e os repórteres não se cansavam de fotografar as luzinhas piscantes das máquinas que haveriam de produzir saber, como uma linha de montagem produz um automóvel. Questão de organização, questão de técnica. Não poderia haver falhas. Começaram as aulas, de clareza mediana. Todo o mundo entendia. Só que o corpo rejeitava….
E assim as coisas se desenrolaram, de fracasso em fracasso, a despeito dos métodos cada vez mais científicos e das estatísticas que subiam. E todos comentavam, sem entender: A educação vai muito mal…
Disponível em http://blogdaformacao.wordpress.com/2007/02/22/a-educacao-vai-muito-mal-2/

7 comentários:

  1. Caro Carlos Eduardo.
    Parabéns pelo seu trabalho.
    Acabei de publicar o seu comentário feito em saude-joni.blogspot.com.br
    Agradeço, de tabela, o seu "estar em disponibilidade" declarado.
    Que seja muito feliz.
    Fraternal abraço.
    Joni

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    1. Obrigado pelo comentário, Joni. A demora na resposta não me passou despercebida, por isso nossas escusas e o fraco argumento de que ainda estou apanhando das novas tecnologias. Abraço

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    1. "Façamos em nós a mudança que queremos ver no mundo!" Obrigado pelo comentário.

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  3. Que tenhamos consciência do nosso importante papel, entendendo que não somos os donos de todas as verdades e que devemos valorizar o conhecimento que cada aluno traz de suas vivências.
    Parabéns pelo seu texto!

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  4. O mundo está repleto de saberes e entender que o valor de cada um deles nos permite aumentar em muito o nosso próprio entendimento e possibilita compartilhamos com nossos alunos muito mais do que poderíamos imaginar.
    Ótimo texto, parabéns.

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  5. Todos nós temos nossas experiências e conhecimentos prévios de acordo com o contexto social em que estamos inseridos. Portanto podemos compartilhar essas vivências com os outros, estabelecendo uma troca, aprendendo e ensinando.
    ótimo texto!

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